Como o aquecimento global provoca chuvas mais pesadas e derrete mais rapidamente o gelo no Ártico, as comunidades Inuit, no Canadá, estão relatando mais casos de doenças atribuídas a agentes patogênicos. Segundo um estudo feito na Universidade de Guelph, no Canadá, os elementos contaminantes são carregados para água superficial e subterrânea.
Os achados corroboram pesquisas anteriores que sugerem que os povos indígenas em todo o mundo são afetados pela mudança climática. Isto acontece porque muitos deles vivem em regiões onde os efeitos se fazem sentir primeiro e com maior intensidade. Além disso, eles estão em contato mais próximo com o ambiente natural em uma base diária. Algumas comunidades indígenas não têm acesso à água tratada, porque estão longe de áreas urbanas, por exemplo.
"No norte, um monte de comunidades [Inuit] preferem beber água de riacho em vez de água tratada. É apenas uma preferência", explicou Sherilee Harper – principal autora do estudo, formada em Epidemiologia. "Além disso, quando eles não estão em terra, caçando ou pescando, eles não têm acesso à água da torneira, então bebem água do riacho".
Para os cientistas, as experiências deste e de outros povos indígenas, que lutam para se adaptar às mudanças climáticas, poderiam ajudar a guiar a humanidade nos próximos anos, quando os efeitos da mudança climática serão sentidos universalmente.
"Essas sociedades são como bolas de cristal para entender o que pode acontecer quando essas mudanças começarem a se materializar ao longo das próximas décadas no sul, como certamente será", disse James Ford, da Universidade McGill, um especialista em adaptação indígena às mudanças climáticas que não estava envolvido no estudo.
"Os cientistas falam frequentemente sobre como os efeitos, com o aumento em quatro graus Celsius (7ºF), serão catastróficos. Mas, onde eu trabalho no Ártico, já vimos a mudança em quatro graus Celsius”, explicou Ford.
O especialista disse que o novo estudo é o primeiro a estabelecer uma relação entre mudança climática e doença em comunidades canadenses do Ártico. "As questões da água têm sido largamente negligenciadas", disse ele.
"Antes deste estudo, houve pouca compreensão do peso da enfermidade de doenças transmitidas pela água no Ártico. A linha de base que temos a partir deste estudo nos permitirá controlar se as mudanças no comportamento fazem a diferença no futuro", analisou o especialista.
A pesquisa, publicada em uma edição recente da revista EcoHealth, é parte de um estudo comparativo de vários anos sobre a maneira como eventos climáticos extremos afetam surtos de doenças transmitidas pela água em comunidades indígenas ao redor do globo.
A equipe está realizando estudos semelhantes entre os pigmeus Batwa, em Uganda, e o povo Shipibo, no Peru. Os estudos ainda estão em andamento, mas resultados preliminares sugerem que, como os Inuits, esses grupos também estão começando a sentir os efeitos sobre a saúde relacionados à mudança climática.
Para cada uma das comunidades estudadas, Sherilee e sua equipe documentaram os padrões climáticos locais usando estações meteorológicas; realizaram testes de água semanais; e procuraram registros clínicos de vômitos e diarréia. A equipe também realizou pesquisas para coletar informações sobre estilos de vida locais.
Com a combinação e análise destes dados em conjunto foram descobertos alguns padrões interessantes. "Nossa pesquisa revelou que após períodos de chuvas fortes ou degelo rápido, existe um aumento de bactérias [tais como E. coli] na água, e cerca de duas a quatro semanas mais tarde, há um aumento na diarreia e vômitos," disse a autora do estudo.
Em Uganda, a equipe descobriu que as famílias que não mantêm seus animais em abrigos têm cerca de três vezes mais probabilidade de ficar doente depois de períodos de chuva forte. A equipe suspeita que patógenos nas fezes destes animais estão sendo levados para a água potável.
Os estudos da epidemiologista fazem parte de um esforço maior do projeto, a Adaptação da Saúde Indígena para Mudança Climática (Indigenous Health Adaptation to Climate Change), ou IHACC. O projeto destina-se a combinar ciência e conhecimentos tradicionais para fortalecer os sistemas de saúde destas comunidades.
Um dos objetivos do IHACC é usar os dados dos estudos para assessorar os formuladores de políticas locais e ajudar a desenvolver formas de melhorar a saúde das pessoas nas comunidades afetadas. Com informações da National Geographic.
Redação CicloVivo