Desenvolvimento

Cidade no RJ deve ganhar hortas fitoterápicas em suas Unidades Básicas de Saúde (UBS)

A inclusão da fitoterapia no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS), a partir do incentivo ao uso de plantas medicinais encontradas no centro-sul fluminense, caminha para se transformar em um projeto comum envolvendo as secretarias de Saúde, Educação, Agricultura e Social do estado do Rio de Janeiro. A iniciativa, utilizada inicialmente na comunidade rural do município de Paty dos Alferes, foi apresentada em Brasília, em dezembro de 2016,  durante a 15ª edição do Prêmio de Incentivo em Ciência e Tecnologia para o SUS, e recebeu a premiação de melhor dissertação em mestrado.

Para o início de março, reunião com esse objetivo está marcada entre os secretários e pesquisadores do Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos), da Fundação Instituto Oswaldo Cruz (Fiocruz). A expectativa é que o estudo seja ampliado e estendido inicialmente a todas as unidades básicas de saúde da cidade, podendo, em seguida, abranger todo o estado.

Essa é a perspectiva da pesquisadora de Farmanguinhos/Fiocruz, farmacêutica Amanda Valverde, responsável pelo projeto. A opinião é compartilhada pelo novo secretário de Saúde de Paty do Alferes, Arlindo Lisboa. As plantas medicinais já eram de uso comum da comunidade para tratamento de problemas como diarreia, gripes e resfriados, entre outros.

O projeto mostrou aos agentes comunitários de saúde, enfermeiros e médicos do SUS como utilizar essas espécies no dia a dia da unidade de saúde.

Cada unidade receberá uma farmácia viva, espécie de horta comunitária, onde são plantadas mudas doadas pela Fiocruz. A fundação apoia o projeto também por meio da identificação das plantas medicinais e elaboração do curso de capacitação, em conjunto com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), voltado para os agentes comunitários de saúde e enfermeiros e médicos da região.

De acordo com a farmacêutica, já chega a quase 90% os melhoramentos registrados na saúde dos membros da comunidade rural, com a disseminação do conhecimento.

Moradores da comunidade rural de Palmares, em Paty do Alferes (RJ), estão tendo contato com práticas integrativas relativas à PNPMF. Foto: Fiocruz / Farmanguinhos

Dados

O trabalho fez parte da dissertação de mestrado de Amanda, baseada em iniciativa criada pela professora da Faculdade de Farmácia da UFRJ, Nina Barboza da Silva.

“A comunidade rural faz uso de plantas medicinais no dia a dia. A Unidade Básica de Saúde local não tinha capacitação para poder trabalhar com planta medicinal”, explicou Amanda Valverde. Dados preliminares mostraram que 82% da população de Palmares faziam uso de plantas medicinais, dos quais 64% consumiam essas plantas na forma de chá. O boldo é a principal planta consumida. Amanda disse acreditar que, com o projeto e o acolhimento de pessoas em busca de informações, esse percentual já aumentou.

Para o secretário de Saúde de Paty do Alferes, que também acumula a vice-prefeitura, a disposição da administração municipal é dar continuidade ao projeto, estendendo-o às oito demais unidades de atendimento básico à saúde da cidade. “Estamos abertos à parceria com o projeto”, afirmou.

Resistência

Coordenador do Núcleo de Gestão em Biodiversidade e Saúde de Farmanguinhos/Fiocruz, Glauco Villas Boas destacou que todos os projetos de plantas medicinais nos últimos dez anos são decorrentes do Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, na tentativa de organização de arranjos produtivos e introdução da fitoterapia no SUS. Villas Boas participou da elaboração do programa nacional.

Segundo ele,  iniciativas como a de Palmares poderão ter, em uma segunda etapa, um projeto estruturante. Citou como exemplo o projeto Farmácia dos Quintais, que parte de articulação entre agricultores brasileiros com institutos de ciência e tecnologia e empresas nacionais.

Ao mesmo tempo em que conserva o conhecimento da população rural, a escolha das plantas passaria por uma certificação, uma avaliação científica. O pesquisador da Fiocruz disse que isso daria potencial para se colocar mais fitoterápicos no SUS e nas farmácias. “Tudo é economia, saúde, biodiversidade e tecnologia. Não ficaríamos tão dependente tecnológica e economicamente (da importação)”.

Villas Boas afirmou que iniciativas em curso no país trazem esperança, mobilizam médicos e secretarias de Saúde. Advertiu, porém, sobre políticas que garantam apoio. “São iniciativas que representam a resistência, a mobilização do conhecimento tradicional, o direito de opção dos brasileiros de tratarem com a terapia que desejarem”.

Para o coordenador, há necessidade de disseminação desses projetos pelo país. Acrescentou que, além de colocar no SUS, os fitoterápicos também devem ser disponibilizados nas farmácias. Na opinião de Villas Boas, a pesquisadora “Amanda (Valverde) fez um bom trabalho”.

Diálogo

Palmares é o projeto pioneiro de introdução de fitoterápicos na terapêutica do SUS no interior fluminense. A meta dos pesquisadores é levá-lo para todo o estado. Para que isso se efetive, Amanda Valverde informou que as políticas existentes devem conversar entre si. Entre elas, citou a Política Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos e a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares, ambas criadas em 2006, o Programa Nacional de Plantas Medicinais e Fitoterápicos, concretizado em 2008, além de legislações posteriores referentes à introdução de plantas medicinais no SUS.

A farmacêutica de Farmanguinhos/Fiocruz afirmou que o compartilhamento do conhecimento tradicional que os moradores de Palmares têm sobre plantas medicinais, aliado ao conhecimento científico, beneficiará a humanidade. “Não é só a saúde. Essa prática atende, sobretudo, à população de mais baixa renda.”

Em Palmares, foi feito inicialmente um levantamento, por meio de entrevistas, para diagnosticar o conhecimento difuso do uso de plantas medicinais na comunidade, selecionando-se as espécies citadas. Após essa etapa, foi montada uma horta comunitária de plantas medicinais na associação de moradores, baseada nas espécies usadas na área, juntando ao conhecimento adquirido no curso de capacitação.

Doze espécies foram selecionadas. “Fizemos um memento fitoterápico de plantas medicinais de Palmares. Ele (memento) fala sobre a forma de terapia dentro do SUS e a maneira como é tratado dentro da comunidade”, disse Amanda.

Na comunidade rural de Palmares não existe farmácia e a Unidade Básica de Saúde não distribui medicação nem faz internação. A única forma de os moradores terem acesso a remédios da indústria farmacêutica é no centro do município.

da Agência Brasil.

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