Após receber críticas de entidades de direitos digitais e a OAB, além da recepção negativa na Câmara dos Deputados, o governo federal descartou a Medida Provisória que tratava da remoção de conteúdo antidemocrático das plataformas digitais. No entanto, as questões consideradas “emergenciais” poderão vir costuradas ao projeto de lei 2630/20 (PL das Fake News), enquanto que outros pontos devem seguir em debate.
“O governo chegou a cogitar uma Medida Provisória, mas já foi anunciado pelo ministro [das Relações Institucionais, Alexandre] Padilha que não haverá MP. É fundamental dialogar com o Parlamento, que construiu uma proposta, no PL 2630/20, que volta a ser relatado pelo deputado Orlando Silva (PCdoB-SP). Já houve manifestações, um esforço de aproximação e diálogo com o presidente da Câmara, Artur Lira. O que não significa que o governo não tem a sua agenda”, afirmou o secretário de políticas digitais João Brant, que nesta quarta-feira (14), durante o seminário Políticas de Telecomunicações, do portal Teletime.
Brant adicionou que, no momento, há um grupo de discussão incluindo a Secom e os ministérios da Justiça, AGU, Relações Institucionais, Ciência & Tecnologia e Cultura, liderado pela Casa Civil. A partir das discussões, os ministros devem avaliar e enviar uma proposta após o Carnaval ao Executivo.
“Combinamos cautela e ousadia. Ousadia porque precisamos de respostas adequadas para o nosso tempo. Por outro lado, cautela significa que essas ações não afetem de maneira inadequada modelos de negócio e liberdade empresarial, não afetem de maneira inadequada a proteção de direitos, e que a gente possa avançar em um ritmo capaz de promover aproximações das diferentes visões em jogo”, disse Brant.
O objetivo é tratar a questão em dois momentos. Uma delas sobre uma forma de exigir atuação rápida das redes sociais para remoção de conteúdo criminoso – tema que foi abordado quando o Ministério da Justiça propôs a extinta MP –, previsto para ser incluído no PL 2630/20. Há pontos que o governo também pretende retirar do projeto.
“Temos que atuar em dois ritmos. Resolver de forma mais rápida o emergencial e estabelecer uma agenda de trabalho e diálogo com o setor empresarial, sociedade civil e Parlamento para tratar com fôlego as questões que não se encaixem nesse primeiro recorte”, disse Brant.
As questões de fundo, no entanto, não poderiam ser tratadas isoladamente pelo Brasil. “Existe uma preocupação grande do presidente Lula de que o debate nacional esteja articulado com o debate internacional. Há uma agenda que corre na Europa, os Estados Unidos estão discutindo vários projetos que mexem na responsabilidade e na própria organização do sistema de proteção de direitos”, sustentou o secretário.
O tema foi assunto de um recente encontro do presidente Lula com o norte-americano Joe Biden, além da presença do líder brasileiro na cúpula da Celac, com 33 países latino-americanos e caribenhos, os quais demonstraram interesse pelo diálogo. “Temos clareza de que não adianta o Brasil atuar de maneira isolada. Assim como as plataformas buscam políticas globais, quanto mais nos aproximarmos de soluções globais, mais eficazes será”, disse.
OAB critica MP em defesa do Marco Civil da Internet
A decisão do novo governo, para tentar evitar episódios como de 8 de janeiro, foi recebida com alerta pelas entidades de direitos digitais e da secção paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que pediram cautela com a MP.
“Há grande preocupação sobre os riscos representados por respostas inadequadas provindas de um processo unilateral, pouco participativo e apressado, com efeitos potencialmente negativos para a estrutura de direitos digitais no Brasil”, diz a nota da OAB-SP.
A entidade havia observado ainda que a indicação da remoção de conteúdo sem necessária ordem judicial atrapelava o que é previsto no Marco Civil da Internet (Lei 12.965/14), além da jurisprudência que vem se consolidando desde então.
“Normas como o artigo 19 do MCI são responsáveis pela manutenção de um equilíbrio frágil que protege, de um lado, a liberdade de expressão dos usuários de internet e, do outro, a inovação no setor de novas tecnologias. A notícia de que o texto da MP poderia criar ‘uma exceção ao artigo 19’ e exige que plataformas removam ataques ao Estado de Direito sem ordem judicial prévia é altamente preocupante. Uma reforma dessa magnitude, que se presta a modificar o núcleo da regulação do tema no país, não pode ser implementada sem debate robusto e prévio”, diz a OAB-SP.
“Não há dúvidas sobre a gravidade do ocorrido no último dia 8 de janeiro e a ameaça representada pela desinformação ao Estado Democrático de Direito. Mas, ainda estamos longe de consenso sobre as respostas que devem ser dadas e as soluções que precisam ser construídas”, diz ainda a entidade.
Com informações Convergência Digital
Créditos: TecMasters